carnet de route
 
Na bacia mineira de Gafsa  
Mobilização por Salah Hamouri  
Primeiro ensaio atómico francês  
Internamento numa clínica  
   
Na bacia mineira de Gafsa  
   
Chegamos a Tunis, com uma delegação. De carro, rumamos a sul em direcção a Gafsa, a porta do deserto. No dia seguinte, tenho o prazer de ir a Rédeyef, a cidade rebelde da qual muito ouvi falar e que conheceu, desde o início do ano, tumultos duramente reprimidos.  
   
A região é rica em fosfato, mas a população nada ganha com isso, excepto os que estão mais próximos do poder. As pessoas, movidas pela miséria, não têm nada a perder. O desemprego é massivo. O grande desafio do regime tunisino é enfrentar os defensores dos direitos humanos. Não se trata de terrorismo.
bassin minier de Gafsa
 
   
A polícia segue-nos por toda a parte, mas deixa-nos trabalhar. Passamos as barragens policiais sem dificuldade. Ao que parece, entrar em Rédeyef é uma proeza, pois a cidade está isolada do resto do mundo.  
   
mères courageurses Viemos manifestar a nossa solidariedade aos detidos da bacia mineira, cujo processo vai começar. A população fica feliz por nos ver, entre ela e com ela. Sabe que existe uma solidariedade internacional. O que mais impressiona são as mulheres que têm o marido ou um filho na prisão. O filho de uma delas foi abatido a tiro pela polícia em Junho passado.
 
   
Estas mulheres, com uma dignidade rebelde, lembram-me as corajosas Mães de Maio da Argentina, no tempo da ditadura. Todas as semanas reuniam-se na praça do Governo, em Buenos Aires, para saberem o destino dos desaparecidos.
Toda a gente aguarda o processo. Tudo indica que serão pronunciadas penas pesadas.
A maneira de agir do regime tunisino é a repressão.
Um regime que beneficia do apoio da União Europeia e, sobretudo, da França.
Quanto aos meios de comunicação social, permanecem estranhamente silenciosos.
 
   
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Mobilização por Salah Hamouri  
   
Na qualidade de membro do comité de apadrinhamento de Salah Hamouri, participo na conferência de imprensa organizada no Senado.  
   
Salah Hamouri Salah tem 23 anos. É franco-palestiniano. Nasceu em Jerusalém, filho de mãe francesa, professora de francês, e de pai palestiniano, restaurador em Jerusalém Leste.
 
   
Salah frequentou a escola dos “Irmãos de Lasalle”, em Jerusalém Leste. Frequentou depois o curso de sociologia na célebre universidade de Belém. Em Março de 2005, foi detido, quando se dirigia a Ramallah. Um mês após a sua detenção, a família soube, pela imprensa, que ele fora acusado de ter conspirado com dois outros jovens, contra o rabino Ovadia Yossef, líder espiritual do partido religioso da extrema-direita, SHAS. O motivo invocado era o facto de os jovens terem passado de carro diante do domicílio do rabino.
Ao fim de três anos de prisão, Salah foi confrontado com uma chantagem odiosa, que consistiu em forçá-lo a declarar-se “culpado”, sob pena de sofrer uma pena de prisão superior a 7 anos.
É refém da ocupação israelita, que julga aqueles que oprime.
Hoje em dia, Salah Hamouri encontra-se numa prisão da Galileia, em Gilboa, no Norte de Israel.
 
   
Apesar de todas as diligências efectuadas e de todas as garantias prodigalizadas, nada se altera. O caso de Salah Hamouri é objecto de um silêncio ensurdecedor.
A mãe dele escreveu-me. Para ela, é reconfortante saber que eu defendo o seu filho.
réconfort
 
   
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Primeiro ensaio atómico francês  
   
essai atomique Foi no dia 13 de Fevereiro de 1960, às 7h04m, no Sara argelino, a sul de Reggane. Esse primeiro ensaio na atmosfera, chamado “Gerbo Azul”, terá uma potência quatro vezes superior a Hiroshima.
 
   
Sou convidado para a antestreia de um filme de Djamel Ouahab, intitulado Gerbo Azul. Narra a história dos militares franceses e dos tuaregues argelinos vítimas dos primeiros ensaios atómicos franceses no Sara, de 1960 a 1966. Os últimos sobreviventes dão testemunho dos combates que travaram para conseguirem o reconhecimento das suas doenças, e revelam as condições em que os ensaio se desenrolaram realmente.
Djamel Ouahab, um jovem argelino, fez um documentário que eu achei soberbo. Apresenta homens unidos na adversidade, atingidos pela História. Homens que, apesar disso, nos falam de paz, de solidariedade e de perdão.
Os jovens franceses, que tinham partido para cumprir o seu serviço militar, não sabiam de nada. Serviram de cobaias. Um deles ficou com o rosto completamente desfigurado. Hoje em dia, têm o sentimento de terem sido traídos e abandonados pela França.
Os tuaregues, privados de qualquer informação, olharam, sem tomarem quaisquer precauções, para o clarão intenso produzido pelo primeiro ensaio. Ficaram cegos.
 
   
As populações dos oásis são gente simples, digna e orgulhosa. Sofrem na maior indiferença e têm um sentimento de profunda injustiça.
les Touaregs
 
   
Franceses e argelinos são homens feridos pela história. Sofreram, do mesmo modo, a incúria dos políticos.
Mas estão unidos pelo mesmo destino trágico da radioactividade. Uma relação íntima, que liga a França e a Argélia para sempre.
 
   
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Internamento numa clínica  
   
É uma experiência que muitos fazem, mais cedo ou mais tarde, nas suas vidas.
Operado a um cancro nos intestinos, submeto-me de boa vontade aos vários ritos de preparação. Aliás, não tenho alternativa! Entre os intervenientes na operação, fico impressionado com o anestesista, que tem o poder de me adormecer e de me despertar. Mágico! Levado para o recobro e rodeado de tubos que me tornam dependente dos outros, travo conhecimento, tanto de dia como de noite, com o pessoal médico, que muito aprecio.
A experiência que o Apóstolo Paulo descreve no princípio da sua segunda epístola aos Coríntios lança uma luz viva sobre a minha situação:
“Somos atribulados? É para vossa consolação. Somos confortados? É para vossa consolação.”
Os sofrimentos de Cristo em nós são fonte de consolação.
Que ensinamento maravilhoso.
“Deus consola-nos em todas as nossas tribulações, para nos tornar capazes de consolar todos aqueles que estão atribulados…”
 
   
O cirurgião passa a visitar-me todas as manhãs. Está satisfeito com o resultado da operação. O cancro foi extirpado, pelo que não haverá necessidade de tratamentos complementares.
satisfait de l'opération
 
   
De momento, aconselha-me a caminhar. Caminho, pois, nos corredores da clínica, travando conhecimento com o pessoal, oriundo de Guadalupe, da Martinica, do Mali, do Laos…
Mais um pouco e deixarei os corredores da clínica para reencontrar, por fim, algo muito melhor: as ruas de Paris.